A agricultura orgânica vem crescendo de forma expressiva no Brasil. Atendendo à expansão do consumo, a quantidade de agricultores que optaram por esse sistema de produção aumentou cerca de 51,7% entre janeiro de 2014 e janeiro de 2015, passando de 6.719 para 10.194, de acordo com informações do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa).
Nos últimos meses de 2015, o Cadastro Nacional de Produtores Orgânicos já computava 11.084 participantes. E a projeção para 2016 é que o setor continue em crescimento, a uma taxa de 20% a 30%, também de acordo com números divulgados pelo Mapa.
A necessidade de responder às demandas tecnológicas do setor define uma nova fronteira para as iniciativas em **pesquisa, desenvolvimento e inovação.**
Exemplo disso foi o projeto “Milho orgânico em consórcio com adubos verdes: opção para o sistema de plantio direto e a integração lavoura-pecuária”, conduzido por Anastacia Fontanetti e apoiado pela FAPESP em acordo de cooperação com o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
Segundo Fontanetti, a busca era por uma alternativa para o controle de plantas espontâneas (popularmente chamadas de “ervas daninhas”), que constituem o principal problema enfrentado pelos produtores de milho orgânico.
Na agricultura convencional, baseada em sementes transgênicas e uso intensivo de herbicidas e outros aditivos químicos, esse controle é feito principalmente por meio do glifosato [N-(fosfonometil) glicina].
Na agricultura orgânica, a principal forma de controle adotada até o presente tem sido o revolvimento do solo. Porém, segundo a pesquisadora, com o revolvimento, ocorre perda de matéria orgânica, exposição à erosão, ou seja, o início de um processo de depauperamento do solo que vai contra o objetivo da agricultura orgânica.
A ideia que norteou seu estudo foi substituir a prática do revolvimento pelo cultivo de plantas que, consorciadas com o milho, promovessem a cobertura do terreno, evitassem a emergência e proliferação de ervas daninhas e melhorassem a qualidade do solo, por meio da reciclagem natural de nutrientes.
Para cumprir tal papel, essas plantas vivas, chamadas de “adubos verdes”, não podem competir com o milho, reduzindo a produtividade. A barreira proporcionada pelos “adubos verdes” à proliferação de plantas espontâneas se deve, principalmente, à cobertura física do solo. Esta reduz a incidência dos raios solares e, por decorrência, dificulta a quebra de dormência e a germinação das sementes de ervas daninhas.
Um fator adicional pode ser a liberação de metabólitos secundários, com função herbicida, pelas folhas e raízes ou pela decomposição da palha dos “adubos verdes”.
Em termos tecnológicos, isso não é uma novidade.
A Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) desenvolveu um modelo, chamado ‘Santa Brígida’, porque foi criado na fazenda com esse nome,** para o plantio consorciado.** Porém, até agora, tal manejo vinha sendo realizado nos moldes da agricultura convencional, com uso de herbicidas. Já nessa pesquisa o objetivo foi estabelecer um manejo para a produção orgânica.
A pesquisadora testou algumas plantas candidatas ao consórcio. Dentre elas, a que apresentou o melhor resultado foi o feijão guandu anão (Cajanus cajan L.), por ser uma planta de porte pequeno, que demora mais tempo para germinar do que o milho, e, por isso, confere a este uma vantagem competitiva.
“Verificamos que o guandu anão não afetou a produtividade do milho, dificultou a proliferação de plantas espontâneas e aumentou o teor de nitrogênio nas plantas de milho – o que pode contribuir para o incremento de biomassa e de produtividade”, informou a pesquisadora.
Além disso, o feijão guandu anão é, ele mesmo, uma planta de interesse. Devido ao alto teor proteico, em algumas localidades do Brasil é utilizado na alimentação humana.
E o sabor agreste, que pode ser matizado por meio de um preparo adequado, já facultou sua inclusão em páginas de gastronomia da web. Outro uso possível é como planta forrageira na alimentação animal.
Por exemplo, soltando-se o gado na área cultivada depois da colheita do milho.
“Fizemos vários testes para descobrir também a melhor forma de plantio. O resultado mais favorável foi obtido quando plantamos o guandu anão tanto nas entrelinhas das fileiras de milho quanto nas próprias linhas, entre um pé de milho e outro”, acrescentou Fontanetti.
Culturas perenes
Outras plantas testadas, com tradição de uso na alimentação animal, foram a puerária (Pueraria phaseoloides (Roxb.) Benth), o calopogônio (Calopogonium mucunoides Desv.) e a soja perene (Neonotonia wightii (Wight & Arn) Lackey).
São plantas herbáceas baixas, menores do que o guandu e bem menores do que o milho. O melhor resultado foi obtido com o calopogônio, que mais rapidamente cobriu o solo, evitando a emergência de plantas daninhas.
Dentre as estratégias utilizadas pelos produtores orgânicos para controlar as ervas daninhas nas culturas de milho, devem-se mencionar ainda o** uso de vinagre (ácido acético) como herbicida, o controle por meio do fogo** e o emprego de um novo equipamento, já disponível no mercado, que extermina a planta indesejável por meio de choque elétrico.
Após a colheita do milho, os adubos verdes são mantidos no solo, pois constituem culturas perenes. Como regra de manejo, Fontanetti recomenda que, depois de retiradas as espigas, as plantas de milho e os “adubos verdes” sejam roçados e seus resíduos mantidos sobre o solo como cobertura.
“Ao se decompor, os resíduos vegetais e as raízes agregam matéria orgânica ao solo. Além disso, é melhor não revolver a terra, mas plantar em cima. O princípio é revolver o solo o mínimo possível. Tanto para preservar os nutrientes como para não expor as sementes de ervas daninhas à luz e ao calor, o que favoreceria sua germinação”, concluiu.
Comments